Vem aí o Natal outra vez! A imprensa que se presa começa a falar dessa data ainda em novembro. O jornalista aprende desde cedo que certas práticas são imutáveis na redação de um jornal, de uma revista, rádio ou rede social que dedica ao cotidiano, pois, certas datas do calendário são presenças obrigatórias nas pautas diárias ou semanais.
Não dá pra omitir os dias das Mães, dos Pais, das Crianças, dos Namorados, Natal, Ano Novo, da Mulher, Carnaval e a Páscoa. Há ainda o mês das mães e das noivas. São pautas que as redações não podem esquecer, e todo ano é a mesma coisa, onde o assunto tem mínimas alterações. O bom é que dá pra usar a matéria do ano passado, onde os detalhes raramente sofrem alterações. São as homenagens, as mensagens, os tipos de presentes, os preços da época, o volume de vendas, as tendências copiadas de um ano para o outro, a brincadeira do amigo secreto, a venda de presentes, o aumento no consumo e outras repetições imutáveis, entra ano e sai ano, há séculos.
Outro assunto comum é a citação de que a sociedade está perdendo seus valores de fé, de respeito, tradição religiosa ou familiar. São centenas de frases de efeitos espalhadas em textos de matérias, crônicas, colunas, programas de rádio, de televisão e até colóquios de esquinas. Coisas que no linguajar de hoje são o tal do mi mi mi. Todos afirmando o que todo mundo está careca de ouvir: que a cada ano o mundo fica mais comercial e que as datas comemorativas estão perdendo os valores espirituais. Frases prontas, que se encaixam em qualquer baboseira, com o objetivo de valorizar o texto. Sempre funciona, sempre tem quem acha linda a hipocrisia.
Mas será que essa história de que a cada ano as pessoas estão mais materialistas é mesmo verdade ou já é também uma tradição de reafirmar uma verdade inventada?
Ainda há que diga que o mundo está ficando cada vez mais espiritualistas, ao acompanhar reportagens lindas na televisão, nos jornais e no rádio sobre pessoas que dão suas vidas para salvar o próximo, gente que doa órgãos, ainda em vida, cidadãos que encontram grande quantidade de dinheiro perdido e entregam aos seus donos, professores abnegados que se doam aos seus alunos, religiosos que enfrentam situações adversas para levar a palavra de Deus a lugares inóspitos, bandidos que se regeneram em nome do Cristo e tantos outros exemplos de amor à humanidade.
Em verdade, as pessoas não estão ficando nem mais nem menos materialistas. O mundo segue igual. O que as pautas precisam é de assunto e, se acabar a tradição de dizer que a cada ano as pessoas perdem valores, quem se desvaloriza é a notícia. Por mais que insistam em dizer que o Natal e outras festas estão perdendo os valores cristãos, elas continuarão a ser comemoradas com o mesmo fervor de sempre por grande parte da população, independente de crenças. O problema é que poucos escrevem sob a ótica da fé. Quem mais fala desses dias são os que olham mais para as prateleiras do que para o altar. São os mesmos que na semana seguinte começam a venda de publicidade para uma nova campanha. Falam mal do consumismo, mas vivem dele.
Talvez o maior mal das comparações é a hipocrisia, que impõe a imbecilidade do “faça o que eu digo mas não faça o que eu faço”.
O mundo continua redondo, as lojas abarrotadas de presentes e as ruas cheias de gente querendo comprar para a ceia de Natal e presentear parentes, colegas e a si próprio. Com fé ou sem fé, Natal sempre será Natal, com a mesma magia de fazer com que as pessoas liberem o seu lado bom, nem que seja por poucos minutos, tempo suficiente para dizer ao próximo, com sinceridade ou hipocrisia: Feliz Natal!